Preste atenção neste termo: Astroturfing. Ele vem da marca de grama sintética AstroTurf — é a arte de fabricar movimentos “populares” que nunca existiram. É o oposto de grassroots, os movimentos genuínos de base.
Em política, comunicação e ativismo, o Astroturfing acontece quando um grupo de estrategistas, marqueteiros ou ideólogos decide criar a aparência de uma “onda espontânea”.
Na prática, é uma coreografia cuidadosamente ensaiada: discursos prontos, hashtags coordenadas, perfis automatizados e uma estética que parece orgânica, mas é feita em laboratório.
Aparentemente é o povo falando, mas o texto foi escrito por alguém nos bastidores.
O Astroturf é perigoso porque engana. Transforma meia dúzia de pessoas coordenadas em “milhares de vozes indignadas”. Simula diversidade onde há apenas cópia e cola. E disfarça manipulação como engajamento.
No Brasil, o fenômeno ganhou força com as redes sociais — especialmente a partir de 2013, quando as manifestações de rua mostraram o poder da mobilização digital.
Desde então, diferentes grupos políticos e ideológicos aprenderam a operar essa máquina de persuasão.
De um lado e de outro, a lógica é a mesma: fabricar a aparência de legitimidade popular para reforçar narrativas e disputar corações e mentes. Movimentos genuínos, por outro lado, têm cheiro de mistura: gente de origens diferentes, opiniões que se chocam, divergências que fazem pensar.
O Astroturf, não. Ele é monocromático. Uniformiza a fala, abafa discordâncias e transforma nuances em pecado. Fala em nome da “diversidade”, mas não a pratica. A base, que deveria ser viva e complexa, vira um eco. E quem ousa questionar, é acusado de traição.
Um movimento que precisa fingir que é unanimidade já começou a morrer. A pluralidade é o sangue da democracia. Por trás do colorido dos cartazes e dos slogans, há uma estrutura opaca, às vezes financiada, sempre dirigida.
É o “movimento espontâneo” com verba, coordenador e planilha.
O resultado é previsível: a base perde autenticidade, o debate morre, e a confiança pública desaba.
Movimentos verdadeiros são imperfeitos, barulhentos e cheios de conflito. Justamente por isso são reais.
O Astroturf é bonito de ver, mas não cria raízes.
É a grama sintética da militância — lisa, sem cheiro, sem alma.
O Astroturfing está em todos os espectros.
À direita e à esquerda, ele se manifesta de várias formas:
– nas correntes de WhatsApp que parecem surgir do nada, com vídeos, memes e mensagens que soam como desabafo popular, mas são parte de campanhas sincronizadas.
– nas “manifestações espontâneas” que acontecem simultaneamente em dezenas de cidades, com cartazes idênticos e palavras de ordem copiadas, raramente são tão espontâneas assim.
– quando partidos, coletivos ou sindicatos apresentam uma mobilização como “horizontal e popular”, mas o discurso já vem decidido por comissões ou lideranças centrais.
– quando petições, fóruns e protestos se anunciam como voz das “bases”, mas repetem a mesma narrativa de um núcleo dirigente.
No centro, o jogo é mais sutil: institutos, consultorias e “movimentos cívicos” que se dizem apartidários, mas têm agendas, financiadores e objetivos bem definidos. Lançam campanhas com linguagem de cidadão comum — “somos todos a favor da boa política” —, mas o discurso é moldado por planilhas, não por praças.
O discurso muda, o figurino muda, mas o mecanismo é o mesmo: a coreografia da unanimidade.
E é aí que mora o perigo.
A palavra “diversidade” virou mágica — todo mundo a usa, poucos a praticam.
É fácil pregar diversidade quando todos pensam igual.
O Astroturf a transforma em maquiagem: cria a aparência de inclusão, mas o comando é vertical, doutrinário e impaciente com vozes dissonantes.
O cartaz é colorido, mas o pensamento é cinza.
Da próxima vez que você se atirar em alguma mobilização para salvar o Brasil e o planeta, repare em qual tipo de grama você está pisando.
É natural ou sintética?
