Meu Ayrton

Nos últimos dias me dediquei a assistir a algumas séries e documentários tratando da vida de algumas pessoas. De Caroll Spinney, que interpretou o imortal Big Bird em Sesame Street, a Eddie Murphy e Charlie Sheen. E entre eles, Meu Ayrton, da Adriane Galisteu.

Há séries que contam histórias. Meu Ayrton revela pessoas.

É curioso como, numa produção sobre Ayrton Senna, a Fórmula 1 vira quase um figurante de luxo. O ronco dos motores está lá, mas funciona mais como trilha sonora — um lembrete constante de que, por trás de cada vitória, existiam vidas inteiras tentando se entender umas às outras.

O que mais impressiona na série não são corridas, mas vínculos. Ayrton aparece não só como o herói nacional, mas como um homem que oscilava entre a pressão do mundo e as dores da própria intimidade. Seus pais surgem não como ícones de uma linhagem vitoriosa, mas como gente comum tentando lidar com o filho extraordinário e, evidentemente, com suas amizades que incluíam – sempre – aproveitadores. Há afeto, orgulho, incompreensão, expectativa — tudo junto, tudo humano.

E então entra Adriane. Não como “a namorada do piloto”, mas como alguém que tenta amar um homem que, mesmo tão luminoso, carregava sombras que ninguém via. A série mostra o choque entre o encantamento e a exaustão de viver ao lado de alguém que pertencia a si mesmo… e ao mundo inteiro.

Adriane é a porta pela qual nós, espectadores, entramos na intimidade emocional de Ayrton.

Mas quem rouba a cena, quase sem pedir licença, é Antônio Carlos de Almeida Braga, um empresário e o melhor amigo de Ayrton Senna, que também foi um importante suporte para Adriane Galisteu após a morte do piloto.

Antônio Carlos de Almeida Braga, conhecido como Braguinha, foi um empresário do ramo financeiro, dono de uma das maiores seguradoras do Brasil, a Atlântica Seguros. Talvez porque ele encarne o tipo de relação que sustenta um gigante: lealdade sem idolatria, cuidado sem subserviência. A série destaca o papel dele como figura de apoio, mostrando que ele ajudou a carreira de Ayrton e, depois, Adriane a superar o luto. Braga vê Ayrton como homem, não como mito. Vê seus silêncios, seus medos, suas manias. A série o coloca onde poucos tiveram coragem de olhar: no território das emoções masculinas, aquele que geralmente fica escondido por trás do capacete.

É impossível esquecer que Adriane tinha 19 anos quando conheceu Ayrton. Despachada, obstinada e nem um pouco deslumbrada, ela vinha de uma vida difícil, que fica bem clara no documentário. Se fosse uma fantasia, Ayrton seria o príncipe que vem conquistar a gata borralheira.

No fim, Meu Ayrton não é sobre velocidade, mas sobre vulnerabilidade. Não é sobre pódios, mas sobre o que acontece quando o capacete sai, a porta se fecha e sobra apenas o ser humano — brilhante, falho, apaixonado, teimoso, frágil.

É uma série sobre amor, sobre limites, sobre o tipo de amizade que não aparece nas estatísticas. Uma história que lembra que até os maiores heróis são, antes de tudo, gente.

A série mudou minha opinião sobre Adriane Galisteu.

 

Agora uma curiosidade: tenho uma dívida de gratidão com Adriane Galisteu. Em 1995, eu encabeçava uma campanha de combate às peças piratas que ameaçavam as vendas das Juntas Homocinéticas, produto fabricado pela empresa na qual eu trabalhava: a Dana.

Uma das ações foi criar uma série de publicações chamada Almanaque Dana. Quase uma história em quadrinhos que contava detalhes de cada produto fabricado pela empresa. Uma das publicações era um folheto com 8 páginas sobre as Juntas Homocinéticas. No estudo de mídia, concluímos que precisávamos distribuir esse impresso para donos de automóveis. E apareceram as revistas Placar e Playboy como veículos para encartar o impresso.

A decisão pela Playboy foi polêmica e colocou meu pescoço à prêmio. Mas eu assumi o risco e fechamos com a revista. A negociação levou algum tempo, não sabíamos exatamente em qual edição apareceria. Cabia a nós imprimir e mandar para a editora encartar na revista inacreditáveis 120 mil exemplares do impresso. Era muito mais do que já tínhamos produzido em nosso mercado. Mandamos fazer e enviamos para a Editora Abril, e a revista foi publicada.

A lendária edição com Adriane Galisteu na capa.

Na mesma semana da publicação, recebo uma ligação da Agência, perguntando se eu gostaria de mandar mais 500 mil impressos, pois a revista estava vendendo horrores. Aquela edição da Galisteu atingiu quase 1 milhão de exemplares. E eu, que havia comprado um serviço de distribuição de 120 mil impressos, acabei recebendo, sem pagar a mais pela veiculação, quase 600 mil. E até no programa do Jô Soares, quando ele abre a revista, nosso impresso cai sobre a mesa…

Não basta ter talento, tem de ter sorte.

Obrigado, Adriane.