UONDERIFI
– É uonderifi. Dábliu, o, ene, dê, ê, erre, espaço, i, éfe. Uon-de-rifi…
Era a professora ajudando com a letra de Imagine, de John Lennon, numa aula de inglês quando eu era garoto. Ele cantava I wonder if you can.
Depois de traduzir, compreendi a letra de Lennon, mas eu era jovem demais para entender a mensagem de paz que transformou a musica num hino.
No entanto, quase 40 anos depois, não esqueci do uonderifi.
Recentemente uma das participantes do Big Brother, a Sol, uma garota de origem humilde, nos brindou com a interpretação de iardeor na TV. Iardeor é a forma como ela canta We are the world. E no Brasil de hoje, onde manifestações de ignorância são festejadas e exibidas com orgulho, ela conseguiu aparecer no Faustão e acho que até gravou um cd.
Mas…Quantos ao ouvir uma música em inglês, entendem a letra? A menos que seu inglês seja estupendo, as músicas pegam mesmo é pelo ritmo, pela sonoridade. Pelo uonderifi.
E sabe qual é a diferença entre o iardeor da Sol e o meu uonderifi?
Para mim, uonderifi representou um rito de passagem da ignorância para o conhecimento.
Num dia mágico, transformou-se em wonder if….
Já o iardeor da Sol é um ponto final. Nunca se transformará em we are the world. Quando o fizer, acabará o interesse, a graça. O iardeor é um rito de passagem da obscuridade para a celebridade. Efêmera.
E antes que algum chato me escreva falando da oportunidade que tive de cursar inglês enquanto a pobre Sol cresceu na pobreza, aviso que essa não é a discussão deste artigo.
Escrevo mais uma vez sobre a total falta de compromisso que a mídia, com uma ferramenta espetacular como a televisão, tem para com a educação.
A televisão, presente na totalidade do território nacional, consegue algo quase impossível: diante dela, todo mundo é igual. Preto ou branco, rico ou pobre, analfabeto ou letrado. É o mesmíssimo conteúdo, não importa para quem. Na frente da tv todos somos apenas um índice de audiência. Não é preciso nem mesmo saber ler. Não existe outra ferramenta mais democrática como processo de comunicação.
No entanto, os que a dirigem perdem um tempo precioso divulgando iardeor em nome do entretenimento.
É pouco, gente. A televisão merece mais que isso. Através dela poderíamos mudar a história deste país.
Mas não…
A máquina que poderia formar cidadãos, comandada por vendedores interessados em trocar seu dinheiro por produtos – sem qualquer compromisso com os valores morais envolvidos nessa troca – forma apenas consumidores.
No dia em que a TV começar a tratar o iardeor da Sol como o meu uonderifi talvez comecemos uma revolução silenciosa neste país.
I wonder if…