Recebi por e-mail o que seria a carta de despedida do jogador Zé Roberto, da seleção brasileira e do Santos, que decidiu voltar para a Alemanha. Leia uns trechos e reflita:
“Por muitos anos vivi com minha família na Alemanha e me identifiquei completamente com o país.. Minhas filhas mal falam português e são totalmente fluentes em alemão. Para voltar ao Brasil, isso pesou muito. Queria que elas se sentissem, como me sentia, brasileiro. Queria que conhecessem o meu país, que falassem a minha língua nativa, queria mostrar o lado bom do Brasil, um pouco diferente daquilo que volta e meia aparece nos noticiários da TV alemã.. A tentativa foi em vão. Todo o tempo em que estivemos no Brasil, ainda que livres fisicamente, éramos reféns psicológicos. Assistir o noticiário televisivo alimentava ainda mais nossos medos. Por sorte, minhas filhas não entendem muito bem o português. Se entendessem, descobririam um país em que o crime está por todos os lados: está nas escolas, está nas faculdades, está no Judiciário, está no Congresso e está até mesmo na família do presidente. Me ponho no lugar delas e penso como deve ter sido desagradável esta estadia no Brasil. O que pensavam quando dizia que era melhor não dizer às amigas que eram minhas filhas? Minhas filhas devem ter detestado o Brasil. Foi com muita alegria que receberam a notícia de que voltaríamos à Alemanha. Batalhei a vida inteira para sair da pobreza e ter sucesso profissional. Hoje, a felicidade de minha família tem como pré-requisito afastar-se do Brasil. Por isso que, ainda que com tristeza, faço o melhor para elas. Aos meus fãs, muito obrigado. Ao Brasil, boa sorte.”
Forte, né?
Zé Roberto descreve o lado negro do Brasil. O lado que não admite o sucesso. O lado da injustiça social, da impunidade, do deboche, da desonestidade,da corrupção, da violência, da desorganização.
Mas tem um detalhe. Essa carta é falsa.
Zé Roberto desmentiu oficialmente. Alguém escreveu, colocou seu nome e lançou na internet, como vem acontecendo com centenas de outros textos. E todo mundo caiu, afinal a situação era muito verossímil. Era possível.
E se amanhã aparecer uma notícia dizendo que passageiros enfurecidos esquartejaram o piloto do avião, é possível! E o que você acha de uma notícia dizendo que o Presidente da Câmara comprou um avião maior que o aerolula? É possível. E se aparecer no jornal que os traficantes do morro do Alemão, no Rio, estão usando tanques de guerra para combater a polícia, o que você achará? É possível. E se o ônibus com o time de vôlei dos Estados Unidos fosse seqüestrado pelo PCC durante o Pan? É possível. E se aquele avião da Gol foi derrubado porque dentro dele viajavam vários cientistas brasileiros que desenvolviam uma tecnologia que ameaçava interesses de grandes grupos estrangeiros? É possível. E se descobrirem que o dinheiro do Fome Zero foi desviado para as Farc, a organização terrorista da Colômbia? É possível. E se o Lula for sócio de FHC e tudo o que assistimos não passa de armação? É possível…
Pois é… O que é que esses absurdos têm a ver com a carta falsa do Zé Roberto? Simples: são absurdos possíveis.
E o mero fato de passar por nossas cabeças que um absurdo desses possa ser possível mostra a que ponto chegamos no Circo Brasil do novo milênio. Nenhum absurdo é tão absurdo que não possa ser possível.
A manipulação das informações é tanta que já não sabemos mais o que é verdade e o que é mentira. Nem mesmo em nossos valores ou convicções confiamos mais para definir o que é certo ou errado. E assim, atitudes absurdas que algum tempo atrás eram impossíveis por imorais, não éticas, desumanas, burras ou preconceituosas -, passam a ser, ao menos no imaginário das pessoas possíveis.
Esse é o Brasil possível, onde tudo é possível.