O tigre da Esso

Semana passada li uma noticia que me entristeceu: a bandeira da Esso vai desaparecer, substituída pela da Shell. Puxa vida… Que triste. Mas foi assim também com a Pan Am, com a Varig, com o Mappin, com a Manchete e tantas outras, não é? Faz parte. Esse acontecimento me lembrou de duas histórias.

Uma vez fui convidado para apresentar o Brasil para a diretoria de uma multinacional norte americana que estava decidindo em qual país fazer um investimento milionário. Fiz a apresentação baseada em valores culturais, mostrando como o Brasil se desenvolveu ao longo do tempo, como é o jeito de trabalhar do brasileiro, nossas similaridades com a cultura dos Estados Unidos e como somos diferentes – e melhores para investir – que Índia, China ou Russia. Ao final, muito aplaudido, ouvi do presidente da empresa:

– Ótima apresentação Luciano. Pena que não possa ser feita para Wall Street.

Eu havia combinado lógica com emoção, causando um grande impacto na platéia. Usei música e carnaval, falei de nosso potencial, qualidades e jogo de cintura, com humor e entusiasmo. Mas Wall Street não fala essa língua. Para eles a única verdade fundamental é: grana! 

Algum tempo depois, uma das grandes empresas com a qual eu me relacionava vendeu uma de suas operações de fabricação e distribuição de um produto muito conhecido no mercado. Foi uma transação global envolvendo bilhões de dólares, na qual o Brasil representava cerca de 10% do negócio. Durante o processo, consultado sobre os termos do contrato, defendi veementemente que a marca do produto, pacientemente construída ao longo de anos, não entrasse no negócio. Que vendessem os prédios, as máquinas, os processos, a carteira de clientes e o sistema de distribuição. Mas que apenas licenciassem a marca. Não teve jeito. O negócio foi feito baseado no valor dos “ativos tangíveis”, uma ninharia. No fim, presentearam o comprador com a marca, que era o ativo mais valioso do negócio. Infelizmente, intangível.

Bem, voltando ao princípio, desconheço as condições do negócio feito com a Esso, mas o anúncio de que a “marca vai acabar” mostra quanto ela vale: nada.

Ah, mas “o mundo mudou, os jovens não tem mais a referência da marca, que já foi esquecida”, etc e tal…

Faço parte de uma geração – economicamente muito ativa – que tem uma referência cultural profunda com a marca Esso. Arrisco-me a dizer que para nós “Esso” não é uma empresa ou um produto. É um ícone pop. Cresci com ela. Peguei o finalzinho do Reporter Esso, curti demais o casalzinho de gotinhas andando de lambreta e depois o “Tigre da Esso que acabou de chegar”. A Esso fez minha cabeça muito antes de eu tirar habilitação e me transformar num consumidor de seus produtos. Mesmo trinta ou quarenta anos depois da Esso perder presença na propaganda, eu a uso como exemplo de um trabalho excepcional de construção de marca em minhas palestras. Guardo a marca no meu coração, junto às lembranças mais queridas de minha juventude. Para mim a Esso é emoção.

Quanto vale isso?

Pena que Wall Street não fale essa língua.

Luciano Pires