Ando cismado com o mas, aquela conjunção coordenativa adversativa que liga duas orações ou palavras e expressa a ideia de contraste, de diferença. Olha só:
FHC saneou o sistema bancário, corrigindo problemas históricos que impediam o desenvolvimento do Brasil, e Lula ampliou políticas sociais que fizeram com que o país evoluísse ao longo da primeira década do milênio.
Agora com uma pequena mudança:
FHC saneou o sistema bancário, corrigindo problemas históricos que impediam o desenvolvimento do Brasil, mas Lula ampliou políticas sociais que fizeram com que o país evoluísse ao longo da primeira década do milênio.
Notou diferença? No primeiro enunciado, um “e” significa que FHC e Lula estão juntos no trabalho de desenvolvimento do país. No segundo enunciado, aquele “mas” anuncia que Lula é o único responsável pela evolução do Brasil. A diferença entre os dois enunciados é a troca do “e” pelo ”mas”.
O brasileiro Neymar é o mais habilidoso jogador de futebol do mundo e o argentino Messi é o que mais faz gols. Opa! Quero os dois no meu time!
O brasileiro Neymar é o mais habilidoso jogador de futebol do mundo, mas o argentino Messi é o que mais faz gols. Humm… Prefiro o Messi no meu time.
Eu tinha um colega de trabalho que respondia a todos os argumentos que ouvia com um ”Sim, mas...” Era irritante, ele nem precisava continuar, todos sabiam que o sim era apenas uma forma de atenuar a discordância anunciada pelo mas.
Mas o mas como oposto, como contraste, conhecemos de sobra. O problema é que nestes tempos de pandemia de mentiras, o mas vem ganhando outras dimensões. Passou a ser aquilo que chamo de Conjunção Coordenativa Escusativa.
De novo: Conjunção Coordenativa Escusativa. Os mensaleiros meteram a mão no dinheiro público, mas foi por uma boa causa. O MST invadiu e destruiu a fazenda, mas aquelas terras são consideradas improdutivas. A corrupção no governo da Dilma é imensa, mas no governo de FHC também era. Lula falou um monte de coisas censuráveis nas escutas, mas o juiz não podia tê-las divulgado.
O mas como Conjunção Coordenativa Escusativa prepara a escusa, a desculpa. Transfere responsabilidades para terceiros, justifica desmandos, atenua consequências e torna normal e aceitável aquilo que deveria ser rechaçado por imoral, ilegal e desonesto. E então temos o
”roubou, mas quem não roubou antes?”,
“A boate pegou fogo, mas os que morreram sabiam que era um local arriscado”;
“A moça foi estuprada, mas estava usando uma saia curtíssima”;
“O sujeito morreu no assalto, mas estava usando um relógio Rolex e dirigindo com o vidro aberto”;
“Osama Bin Laden jogou dois aviões nas torres gêmeas, mas Bush invadiu o Afeganistão”;
“Ainda morrem presos políticos em Cuba, mas lá todas as crianças estão na escola”, e assim vai.
Entendeu? O “mas” como Conjunção Coordenativa Escusativa funcionando como uma espécie de compensação, que livra a cara dos criminosos.
Se você gosta de usar o mas, preste bem atenção para não usar como desculpa. Jamais perca de vista que quem escolhe, defende e protege o ruim porque antes era pior, continua escolhendo o ruim.
Mas tem gente que nem percebe…