Sabe aqueles professores que deixam uma marca na vida da gente? Eu tive alguns assim, não muitos, cuja lembrança sempre me vem com carinho. Em novembro de 2014 estive em uma reunião comemorativa dos 40 anos de formatura no Colégio Técnico de Eletrônica, da Fundação Educacional de Bauru e, junto a colegas da época, pude reencontrar alguns professores. Dois deles estão na foto que ilustra este post. José Humberto Santana (de verde) e Rubens Zapater. Santana foi meu professor de ciências e o Rubens foi o diretor do colégio. Revê-los foi uma emoção forte.
Sempre tive uma fascinação pela ciência, desde moleque li muito a respeito, especialmente astronomia e paleontologia, e não foi difícil estabelecer uma empatia imediata com o Santana. Ele tinha na época por volta de 32 anos de idade e surpreendia a garotada com suas aulas inusitadas, o jeitão de falar, o sorriso sempre pronto e o carinho com que se dirigia aos alunos. Numa ocasião, diante da bagunça da molecada, ele colocou sua cadeira sobre a mesa, subiu e ficou lá sentado vigiando a turma enquanto a prova corria solta. Aquela atitude ficou marcada em mim, como uma demonstração de irreverência, humor e capacidade de inovar num ambiente avesso à inovação.
Noutra ocasião acompanhou a turma até um churrasco num rancho de beira de rio, jogando futebol, falando abobrinhas, tocando violão e se transformando em um de nós. Era impossível não gostar do Santana.
E aí me recordo de um exercício que sempre proponho em minha palestra Gente Nutritiva: cada pessoa que tenha cursado até uma faculdade teve ao longo da vida talvez uma centena de professores. Pergunto então quem da plateia é capaz de me dar o nome de cinco desses professores que fizeram diferença real em suas vidas. Poucos levantam as mãos. É difícil lembrar cinco entre os cem, não por falta de memória, mas porque são realmente poucos os que realmente fazem a diferença.
Peço então às pessoas que lembraram de algum nome, que respondam: por que aquele professor ou professora fez a diferença?
Pelo conhecimento que tinha da matéria dada? Não.
Por ter dado notas boas? Não.
Por ser acessível ou camarada? Não. Nunca é por essas causas.
Aquele professor ou professora fez a diferença por demonstrar que se preocupava verdadeiramente comigo. Por deixar claro, nas palavras e atos, que queria o meu bem, queria me ver crescer. Por, mesmo quando me repreendia, deixar evidente que havia ali a intenção de me fazer uma pessoa melhor. Por demonstrar que existe uma espécie de amor entre mestre e aluno.
O Santana era assim. E acabo de receber a notícia de que ele faleceu hoje em Bauru, aos 70 anos de idade. O encontrei muito pouco, talvez duas ou três vezes ao longo dos 40 anos desde que me formei. Mas em todas as vezes aquele sorriso, o abraço, o jeito interessado de falar, a curiosidade verdadeira de saber de mim, estavam presentes.
Deixo aqui como uma homenagem ao mestre Santana, uma pequena fala de Rubem Alves, outro mestre:
“ Educar é mostrar a vida a quem ainda não a viu. O educador diz: ‘Veja!’, e ao falar, aponta. O aluno olha e vê o que nunca viu. Seu mundo se expande! Ele fica mais rico, ele pode sentir mais alegria e dar mais alegria, que é a razão pela qual vivemos. O milagre da educação acontece quando vemos um mundo que nunca havíamos visto.”
É isso. Guardo o Santana no lado esquerdo do peito pois, fingindo que ensinava, o que ele mais me deu foi alegria.
Vá em paz, meu amigo.