Complexo e outros males

Uma das expressões que a esquerda (radical ou não) adora usar é o tal “complexo de vira-latas”. Essa gente não tem a menor ideia do que seja isso, nem de quem cunhou a expressão, mas a macaqueia reiteradamente, invocando-a como mantra para suas asnices nacionaleiras dignas do milênio passado; na sua visão troglodita, significaria uma espécie de medo, uma vergonha, um certo derrotismo de que o brasileiro sofreria em relação aos outros países do mundo, principalmente quanto aos mais ricos. Taspariu. A cegueira dos lulistas é tão intensa que transcende a ideologia mais furada do mundo até alcançar a realidade paralela onde seu guru presidiário reina, e onde Gleisi Hoffman navega. É tão grave o estado demencial que chega a ser difícil separar a insanidade do puro interesse travestido de… insanidade.

O pernambucano Nélson Falcão Rodrigues (1912-1980) foi um dos mais importantes dramaturgos do Brasil, seguido e perseguido por toda e qualquer trupe do ramo; todos sonham em atuar sob seus textos. Polêmico, também foi jornalista, escritor, cronista, e escrevia com uma verve absolutamente invejável. Construía frases impagáveis, dignas de seu, digamos, “antecessor” Barão de Itararé (Apparício Fernando de Brinkerhoff Torelly, 1895-1971), humorista, mestre do assim chamado hibridismo linguístico. Deixe de preguiça e veja no Google.

Voltando: Nélson se definia como reacionário; em resposta às críticas, principalmente sobre seus textos de uma realidade dolorosa, uma crueza ímpar, se dizia um sentimental, e um “anjo pornográfico”. Tinha absoluto desprezo pelo comunismo e pela esquerda em geral, e lamentava profundamente a militância comunista do filho. Ironia da vida; dele e de qualquer outro que habite essa nau dos insensatos chamada planeta Terra.

Apaixonado pelo futebol e agoniado com a derrota da seleção para o Uruguai em pleno Maracanã (1950), não se conformava em ver o título de campeão mundial escapar daquela forma. Intuiu sobre parte da culpa ser de nossa incapacidade futebolística ao ombrear com as demais potências no esporte. Teríamos tudo, inclusive os craques, mas esse complexo atávico nos impediria de ganhar. Interessante teoria; mas para o determinado esporte quando ainda não éramos campeões do mundo, e até cabível nos distantes anos 50 do século XX; mas nunca no sentido usado pelo lulismo.

Nélson Rodrigues escreveu (e representa) tudo que a esquerda brasileira odeia. Mas como esses aí nunca leem um livro decente nem ao menos folhearam um de sua autoria – ou de nenhum outro tipo, como o presidiário-chefe da seita declarou. Ler é um hábito chato, bufou em rede nacional. Também afirmou que estudar e falar inglês são bobagens, mas vamos deixar isso pra outra discussão.

Citar Nélson Rodrigues num país onde a mediocridade campeia é chic; para os lulistas, funciona como uma pretensa sofisticação que poucos se dão ao trabalho de conferir através de uma simples leitura; é chato, como prega seu líder presidiário. Daí, para embasar o movimento brilhantemente apelidado de “megalonanico” nas relações internacionais dos tempos lulistas, fantasiaram (e insistem nessa demência) que naquela fase o Brasil “era respeitado lá fora”, e hoje não seria mais em razão do tal complexo de vira-latas. Quem repete isso não conhece o Brasil, nem “lá fora”, e nem a obra de Nélson. Mas papagueia as desculpas genéricas e os ataques tolos a tudo que não seja exatamente o que pregam.

É como citar Macunaíma, o herói sem nenhum caráter, de Mário de Andrade, para definir um sujeito em evidência amoral. O autor nunca disse ou sugeriu isso; referia-se, sim, ao personagem que não tinha nenhuma característica de herói, não tinha jeito nem tipo para isso. Mas como mais vale uma ideia criada do nada do que a leitura de um clássico… Ficamos assim. Outras pérolas virão, principalmente dessa gente que adora Marx, porém nunca leu uma única página de seus livros. Não precisa ser culto, camarada; basta parecer e enganar os trouxas. Assim é, na vida e nas eleições.