Canários passam a vida numa gaiola segura, com comida e água em abundância, veterinário e todos os cuidados necessários para cumprir sua nobre função: cantar. Onde existe um canário a vida é mais alegre. E eles são lindos! Cantam, portanto são felizes.
Já os sabiás não servem para ser criados em gaiolas. Sabiás não são tão bonitos, as penas não são tão coloridas e seu canto não chega aos pés dos canários. Sabiás não são graciosos como os canários, precisam lutar pela sobrevivência. Em compensação, sabiás voam e levam a vida em total liberdade. São livres, portanto são felizes.
Um dia, depois de 26 anos trabalhando numa multinacional, abri a porta da gaiola para enfrentar o mundo lá fora. Meu voo solo. A maturidade me trouxe outras prioridades. Cantar alto e melodioso deixou de ser o objetivo, o tempo passou a ser valioso demais para ser desperdiçado com os rituais do mundo corporativo. A maturidade quer resultados. Quer voar. Ver o mundo de cima. Quer prazer. Quer crescer. Quer ousar.
A segurança da gaiola, os alimentos fartos, os cuidados médicos passam a ter um custo altíssimo: a liberdade.
Por 26 anos preparei o voo, aprendendo a navegar, a planejar, a surpreender, a observar, a criticar, a inspirar. Reforcei as asas e me lancei no espaço com aquele frio no estômago da ansiedade com medo. Muitos canários gritaram:
– Cuidado! Lá fora é perigoso!
Outros sabiás, grandes voadores, me acolheram alegremente dizendo:
– Não é fácil!
Inebriado com a liberdade, dei cabeçadas nos muros, passei fome e frio até aprender a encontrar comida e abrigo. Mas quando eu estava em pleno voo, olhando o horizonte e as copas das árvores com o vento no rosto e o calor do sol em minhas costas, lembro bem do que passou por minha cabeça:
– Preciso contar pros canários!
