Quem tem o meu DNA – Data de Nascimento Avançada, sabe que rock and roll, mais que um gênero musical, é atitude. É uma resposta em forma de acorde distorcido a um mundo que insiste em calar quem pensa fora da caixinha. É o grito de quem se recusa a marchar em fila. Por isso, é tragicômico — ou só trágico mesmo — ver um roqueiro com mais de 60 anos, tendo ataque de pelanca no palco quando descobre que tem na plateia dezenas, quem sabe centenas, de pessoas que não têm a mesma orientação política que ele. Pior ainda é ver alguns velhos roqueiros aplaudindo abertamente ações autoritárias de um Estado que prende, censura e cala quem ousa discordar. Logo eles, que já foram a trilha sonora da inconformidade.
O caso mais recente é o do Nasi, vocalista da banda Ira!, mas seu colega de profissão Nando Reis também experimentou recentemente a mesma situação ao usar o palco para fazer panfletagem política e descobrir que nem todos os fãs concordam com ele. Mas Nando foi mais esperto, não jogou gasolina no fogo.
Rockeiro que defende o controle público ou estatal sobre pensamento e expressão é como punk que pede autorização pra protestar: perdeu o compasso. O verdadeiro rock nunca pediu licença, nunca baixou a cabeça. Lennon não pediu bênção à Rainha. Raul não foi ao DOPS pedir permissão para cantar. E Renato Russo, com “Que país é esse?”, não esperava aplausos do Planalto. Rockeiro de verdade não se incomoda com o que os outros pensam, ele incomoda o pensamento dos outros — porque ser roqueiro é ser livre, mesmo que essa liberdade custe caro. Livre até para ter ataque de pelanca no palco.
Mas então, onde é que a coisa pega?
Hoje, parece que a rebeldia virou figurino de palco. A jaqueta de couro virou cosplay de indignação. O grito foi domesticado, a crítica vendida a prestação. O mesmo sujeito que um dia cantou “envelheço na cidade” agora envelhece dobrando o joelho para o Estado. E ainda bate palmas.
O que estamos vendo é um fenômeno de domesticação cultural. Artistas que antes cuspiriam no sistema, hoje se alinham a ele. Que tipo de “rockeiro” celebra a prisão de quem se manifesta contra governos autoritários? Que “libertário” apoia censura em rede social? Isso é rock? Não. Isso é covardia com solo distorcido.
Se você balança a cabeça ao som da guitarra, mas não suporta quem pensa diferente, talvez não tenha entendido o espírito do rock. Ou pior: talvez tenha trocado o rock por um pouco de aprovação nas redes sociais.
O velho roqueiro envelheceu muito mal na cidade.