O ano era 1974. Eu tinha acabado de fazer meus 18 anos e estava ali para fazer o exame prático para tirar a carteira de motorista.
Era um horror. Uma fila de carros esperando, e eu olhava pelo retrovisor o examinador caminhando na minha direção. O coração parecia uma bate estacas, a respiração ofegante, eu suava como louco. Minha mãe tinha me dado um crucifixo de prata para eu usar na hora do exame.
O carro que eu usaria no exame seria o mesmo no qual aprendi a dirigir: um “dodginho” do instrutor, bem baleado.
Chegou o examinador. Sentou ao meu lado e mandou que saíssemos. No seu colo uma prancheta aonde ia tomando notas. Segui pela Avenida Nações Unidas, de Bauru.
Fiz uma volta e, quando estou acelerando, ele me surpreende com uma ordem: “Vire à direita”. Era uma curva fechada, numa lombada. Eu já estava em cima da curva, tive que fazê-la de forma um tanto quanto rápida.
E no meio da curva minha porta abriu.
“Virge Maria!” Gritou o examinador.
Instintivamente, enquanto eu fazia a curva com a mão direita, puxei a porta com a esquerda e a fechei. Parei o carro uns metros adiante e dei com o ombro na porta, que abriu de novo. Fechei novamente. Dei com o ombro e ela abriu outra vez.
– Pode voltar, que esse carro não tem condições de continuar.
Voltei decepcionado. Eu sabia que teria que esperar algum tempo para fazer novo exame e o que me incomodava era ter que passar por toda aquela ansiedade pré-exame outra vez.
Estacionei o carro no local indicado e fiquei esperando que o instrutor fosse falar com seus colegas. Que agonia!
“Olha, esse carro não tem mesmo condições” disse com a voz grave o examinador. “Mas pelo que você fez ali na curva, vou te aprovar”.
Não pude acreditar. Não fiz nem um quarto do exame, não fiz baliza, não fiz rampa, nada…O que me fez segurar a porta com uma mão e fazer a curva com a outra, impressionando o examinador, foi meu instinto. Pura, puríssima emoção. A habilidade que eu tinha era a de um estudante de auto-escola…
E foi assim que tirei minha carteira de motorista.
O crucifixo, que era prata, estava preto…
A lição que aprendi naquele dia, aos 18 anos, apliquei para toda a vida: nos momentos decisivos, sempre uso a lógica, o julgamento crítico e as habilidades que desenvolvi nos treinamentos.
Mas a decisão final, quem toma é a emoção.